A zona de conforto de Jurassic Park tem
nome: Isla Nublar e Isla Sorna. Para a franquia avançar, foi necessário
sacrificar estes lugares familiares. Os roteiristas Colin Trevorrow e Derek Conolly entregam Jurassic World: Reino Ameaçado como o filme
mais diferente da série até agora. A progressão até o ponto em que a história
se encontra agora não soa forçada, e sim, fluída e natural. Eles inovaram e
arriscaram com ideias que poderão levar a franquia a um novo patamar.
Dirigido pelo espanhol J.A. Bayona, o filme já inicia em grande
estilo com uma das melhores cenas de abertura entre os quatro anteriores. Logo
nos primeiros cinco minutos, é possível notar que estamos diante de uma
criatura diferente: enquanto o filme anterior, Jurassic World (2015,
dirigido por Trevorrow), focou nas maravilhas e deslumbres dos dinossauros,
emulando o sentimento das primeiras aparições dos animais no clássico de Steven
Spielberg, Reino Ameaçado foca na segunda parte de Jurassic
Park, cheio de tensão e suspense. Há momentos assustadores e que você fica com frio na barriga, apreensivo em relação ao que pode acontecer.
Na história, a Isla Nublar está sendo ameaçada por um vulcão
prestes a entrar em erupção, o que coloca toda a vida na ilha em risco - somos apresentados a este contexto de forma muito didática, que deve agradar aos fãs que pedem uma cena similar a esta há anos.
Claire
Dearing (Bryce Dallas Howard), ex-gerente de operações do parque temático
Jurassic World, sente uma parcela de culpa pelos eventos trágicos que
acarretaram no fechamento e abandono do parque, há três anos. Deste sentimento,
nasce o Grupo de Proteção do Dinossauro, que busca financiamento e apoio
popular para convencer o governo americano a salvar os animais deste evento cataclísmico.
Trabalhando ao seu lado estão Zia Rodriguez (Daniella Pineda), uma veterinária
de dinossauros, e Franklin Webb (Justice Smith), técnico em computação.
Ela recebe uma ligação de Eli Mills (Rafe Spall), que gerencia
a fortuna de Benjamin Lockwood (James Cromwell), um ex-parceiro de John
Hammond, fundador e idealizador do Jurassic Park original. Mills revela que
Lockwood planeja resgatar os dinossauros e juntos organizam uma expedição à
ilha para resgatar os animais. Claire pede ajuda a Owen Grady (Chris Pratt),
que se isolou no norte do país desde que o fim do relacionamento dos dois. Para
convencê-lo, ela usa a velociraptor Blue, que foi criada desde filhote por Owen
e que corre risco de vida se continuar na ilha.
O grupo chega então à Isla
Nublar e descobre que Mills talvez tenha outros planos para os dinossauros. No
fim das contas, os personagens acabam indo parar na propriedade de Lockwood, em
que grande parte da ação ocorre e onde se encontra o novo híbrido, Indoraptor –
com DNA da Indominus Rex e de velociraptor.
A primeira parte do filme tem um ritmo acelerado, mas apresenta
bem os novos personagens. Eli Mills é carismático, mas um tanto descompassado, e seu personagem se mostra um dos vilões mais perversos da série.
Benjamin Lockwood parece genuinamente disposto a fazer a coisa certa e corrigir
os erros do passado, além de inspirar empatia por sua aparência frágil, apesar
de claramente guardar um segredo sombrio. Sua neta, Maisie (Isabella Sermon, em
sua estreia no cinema), é curiosa e esperta. Toby Jones, que interpreta Gunnar Eversoll, é ganancioso e Ken Wheatley (Ted Levine), é charmoso, porém desprezível - um Roland Tembo, de O Mundo Perdido, mas muito menos amável.
Bayona descreveu a segunda parte do filme como “claustrofóbica”.
Trazer a ação para um ambiente rotineiro – como Jurassic Park fez na cena da cozinha – acrescenta uma camada de
terror e suspense, é como se estivéssemos em um pesadelo.
O tom deste filme é mais sério que o de Jurassic World. Em vez de simplesmente nos maravilharmos com essas
criaturas, nós também as tememos. É como assistir a um documentário sobre
leões: você os acha magníficos, mas tem a noção de que são muito perigosos. A
inversão das vítimas – agora os humanos são os “vilões” para os dinossauros –
também funciona muito bem. O filme depende do seu apego emocional por esses
animais.
A relação de Owen e Blue é melhor explorada e torna mais crível
todo o comportamento da velociraptor. Bayona descreve Blue como sendo “o
coração do filme”, e ela realmente é, pois o roteiro gira em torno dela e de
sua importância.

Já o “vilão” Indoraptor é competente, mas não rouba a cena como o “primo”
Indominus Rex. Ele funciona como
antagonista e estrela algumas das melhores cenas do filme, mas o foco está nos dinossauros
“reais”.
Os efeitos visuais estão melhores do que nunca, sejam eles gerados
por computador ou animatrônicos. Bayona aposta em planos fechados nos rostos
dos dinossauros e não desaponta com a qualidade dos detalhes – há cenas assim
com o carnotauro, o stygimoloch, velociraptor, T. rex e até braquiossauro. Aliás, cada dinossauro tem seu momento de destaque e alguns voltam a fazer pequenas aparições durante o filme, o que deve satisfazer os fãs.
O elenco, como sempre na franquia Jurassic Park, é de primeira. Os
protagonistas Bryce Dallas Howard e Chris Pratt se entregam e se divertem em
seus papéis, enquanto as novas adições como Rafe Spall, James Cromwell e
Geraldine Chaplin, que dá vida a Iris, governanta da família Lockwood, dão um show de interpretação nas cenas mais
dramáticas. Isabella Sermon, a criança Maisie, é muito competente e se expressa
de maneira sincera em todo o seu tempo de tela.
Grande parte da beleza do filme vem do diretor J.A. Bayona e sua
equipe – como o diretor de fotografia Oscar Fauna. O longa traz alguns dos
quadros mais belos da franquia, desde a sua abertura em uma Isla Nublar durante
uma das maiores tempestades já vistas nos filmes, até as cenas na Mansão
Lockwood, com o Indoraptor nos arredores da propriedade. Bayona abusa do visual gótico e do jogo de luz e sombra, quase um chiaroscuro. Destaque também para a própria animação do título do filme, que se diferencia de todas as outras até agora.
A ação está melhor do que nunca. Há mais lutas corporais (entre humanos) e os
dinossauros não estão para brincadeira. Os herbívoros se mostram perigosos e a T.rex, depois de tanto tempo, finalmente come alguém de novo. A erupção vulcânica é impressionante e garante um senso de urgência, já que a "sombra" do vulcão está a espreita em todas as cenas na ilha.
Entre os pontos negativos do filme, está a falta de peso a um
certo fato revelado. A revelação, em si, se conecta a outros pontos cruciais da
história e é uma aposta interessante, mas faltou um conflito interno nos
personagens para ganhar a importância que poderia (e deveria) ter.
O compositor Michael Giacchino reutiliza temas consagrados no
filme anterior, mas surpreende por não apresentar o tema principal da franquia
em diversos momentos óbvios que outros compositores julgariam obrigatória a
presença. A escala épica da trilha-sonora, com coral, funciona em algumas das
cenas, mas soa exagerada em outras. Faltaram temas marcantes, como a famosa “Chasing
the Dragons”, de Jurassic World.
Há também cenas que foram criadas exclusivamente para o marketing do filme e serem exibidas em
trailers e pôsteres, pois não encaixam tão bem na progressão do filme – os roteiristas
poderiam ter achado outras soluções. Contudo, não deixam de serem bonitas de
ser ver.
Claire, agora usando botas, não é a líder que poderia ser. Apesar
de tomar a dianteira em alguns momentos de ação, ela parece continuar a
precisar e ser guiada por Owen. Outra personagem feminina que poderia ter sido
apresentada de forma mais convincente é a paleoveterinária Zia, que é uma
mulher forte e decidida, mas o roteiro parece querer evidenciar isso por meio
de falas prontas, em vez de mostra-la em ação. Esta personagem e seu colega de
trabalho, Franklin, apesar de divertidos, não tiveram espaço para se
desenvolverem por completo. Franklin, que é bastante covarde durante todo o
filme, tem seu momento de coragem, mas não passa disso.

O filme se assemelha muito a O
Mundo Perdido: Jurassic Park, tanto em trama quanto em contexto, mas é
inspirado o suficiente para não soar como um remake e diverge do filme de 1997 por ir até o fim com suas
propostas. Se aquela cena do T. rex em San Diego acontecesse neste ponto da
série, ela não soaria tão mal como na época.
Bayona faz várias referências a todos os filmes da franquia –
exceto, talvez, Jurassic Park III
(2001). A cena de apresentação de Claire faz referência a Jurassic World, e mais para frente, temos referências muito claras
à Jurassic Park.
O final deixa um grande gancho para a sequência e nos faz
imaginar o que virá a seguir.
Reino Ameaçado dá o maior passo da franquia em direção
ao futuro desde que a Isla Sorna, o Sítio B, foi revelada em O Mundo Perdido. As consequências da
manipulação genética e do poder da clonagem finalmente são sentidas no mundo
real, além das ilhas e dos parques. Os debates morais de Michael Crichton, autor
do romance original, que reverberaram tão bem em Jurassic Park, estão de volta – a figura do dr. Ian Malcolm (Jeff
Goldblum) dá o tom no início, mas o longa retoma as reflexões no penúltimo e
último ato.
Diferente o suficiente para não cair na mesmice, mas ainda com as
características que tornam a franquia o que ela é, Jurassic World: Reino Ameaçado é a sequência ousada que esperamos
desde 1993.
Por Bruno Fernando, para Mundo Jurássico BR.
Nenhum comentário:
Postar um comentário